Levantamento do Podcast Cafezinho com base em dados do portal Tome Conta, do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, mostra que entre os anos de 2021 e 2024, diversos apoiadores políticos do atual prefeito foram nomeados para esse tipo de cargo. Aqui, traremos brevemente uma explicação de como funciona uma nomeação por cargo comissionado, a diferença para uma função de confiança e o porquê dele ser, muitas vezes, utilizado como moeda de troca para apoio político e eleitoral (Foto de Tima Miroshnichenko para Pexels) |
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Cargos comissionados são estruturas funcionais autônomas que podem ser ocupadas por indivíduos sem vínculo com o órgão. Geralmente, esses cargos são para chefia, direção e assessoramento dentro da administração pública. A escolha de alguém comissionado, por mais que seja prerrogativa de um Prefeito (no caso do município, por exemplo), baseado em critérios pessoais como indicação de alguém próximo ou por sua própria preferência, deve levar em consideração também a competência profissional de quem irá ocupar tal cargo para a área a qual foi designado. Existe uma diferença entre cargos comissionados e as chamadas funções de confiança: neste, somente servidores efetivos podem exercer tais funções. Nos casos de exoneração da função de confiança, o servidor volta a ocupar o cargo efetivo.
Alguns gestores, seja por desconhecimento ou por eventual dolo, extrapolam os limites da adoção de critérios exclusivamente pessoais para os comissionados: inclusive, delegando a eles atribuições que, originalmente, não são de suas competências. Aqui, ocorre o chamado desvio de função do servidor público. Pessoas que não tem ligação com a administração pública e que foram indicadas como comissionados, mas que exercem funções de confiança (privativos de servidores efetivos) ou mesmo efetivos que exercem funções de confiança legalmente, mas não recebem o devido acréscimo em suas remunerações.
O Conselho Nacional do Ministério Público vem prestando atenção nos critérios adotados pelos gestores municipais e estaduais, que se utilizam da natureza dos cargos comissionados para praticar nepotismo e dinâmicas de poder, remunerações suspeitas e interesses, inclusive políticos. Em Buíque, município do agreste de Pernambuco, não é diferente.
Dados mais recentes disponibilizados no portal Tome Conta, do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, apontam que de 2021 para 2024, houve um aumento de 39,6% nos cargos considerados comissionados da Prefeitura de Buíque. As informações trazidas no portal foram atualizadas em 31 de agosto e refletem o conteúdo enviado pelos gestores, não representando, necessariamente, dados auditados.
Em janeiro deste ano, haviam 281 servidores comissionados em Buíque. Nos dois meses seguintes, até houve redução nesse número, mas em abril voltou a subir as contratações nesta modalidade, assim como em junho e julho: chegando a 294 no referido mês. Em agosto, cinco foram exonerados pelo prefeito Arquimedes Valença, e o total ficou em 289.
Fonte: Tome Conta/ TCE-PE |
Somente no mês de agosto (conforme mostra a imagem acima), as remunerações dos servidores comissionados consumiram mais de R$ 900 mil do cofres públicos (13,14% da folha de pagamento total para o mês, que ficou na casa dos R$ 6,8 milhões).
São 18 Fiscais de Ações Setoriais com vínculos vigentes. A todos eles, foram pagos R$ 48.008,00 (quarenta e oito mil e oito reais): o que daria, em média, pouco mais de R$ 2.660 mensais a cada de remuneração. A fiscalização setorial é o acompanhamento da execução do contrato nos aspectos técnicos ou administrativos, quando a prestação dos serviços ocorrer concomitantemente em setores distintos ou em unidades desconcentradas de um mesmo órgão ou entidade. Só que, além destes fiscais, ainda existe o cargo comissionado de Fiscal de Contratos que, em tese, desempenharia as mesmas funções. Um destes Fiscais de Ações Setoriais é o ex-vereador Félix Benício de Siqueira, conhecido como Félix Mago, nomeado em julho de 2022 e que ainda ocupa essa função.
Os secretários municipais também são cargos comissionados. Buíque conta com 13 ao todo, e cada um deles recebe uma remuneração mensal de R$ 7 mil.
Abrindo um pouco mais o campo de visão sobre os cargos comissionados e levando em conta os dados disponibilizados pelo Tome Conta de 2021 para cá, tivemos os seguintes casos:
- Vanildo Almeida Cavalcanti, ou Dodó, que foi Coordenador do Gabinete do Prefeito de fevereiro de 2022 a abril deste ano. Sua exoneração foi para cumprir com a lei eleitoral, já que se lançou candidato a Vereador pelo MDB. Há contra ele um processo por improbidade administrativa em tramitação na Justiça;
- Tarcizio de Macedo Almeida, ou Tarcizio da Rebeira, que foi Supervisor de abril de 2021 a julho deste ano. Sua exoneração foi para cumprir com a lei eleitoral, já que se lançou candidato a Vereador pela Federação PSDB-Cidadania;
- Ernani Peixoto Cavalcanti Neto, ou Ernani Neto, que foi Administrador Regional da Vila do Carneiro de maio de 2021 a abril deste ano. Sua exoneração foi para cumprir com a lei eleitoral, pois o mesmo pretendia se lançar candidato a Vereador, porém desistiu e hoje apoia a reeleição de Peba do Carneiro (filiado ao MDB);
- Antonio Anísio de Souza, ou Anísio de Dedé, que é Secretário Adjunto de Planejamento desde janeiro de 2021 e aparece constantemente em atos de campanha do candidato a vereador Wilson Santana (Federação PSDB-Cidadania) e do candidato a Prefeito e atual vice-prefeito municipal, Túlio Monteiro (MDB);
- Sandra Pereira das Silva, ou San Produções, que foi Supervisora de janeiro de 2022 a julho deste ano. Sua exoneração foi para cumprir com a lei eleitoral, já que se lançou candidata a Vereadora pelo MDB. San também era responsável por prestar serviços de assessoria de imprensa à Prefeitura de Buíque, ainda que isso não conste nos dados enviados ao Tribunal de Contas do Estado;
- José Rômulo Padilha de Almeida, ou Rômulo Camelo, que consta como Coordenador de Ações Administrativas desde julho deste ano. Rômulo é tio do candidato a Prefeito de Buíque, Jobson Camelo (Republicanos).
Com exceção de Rômulo Camelo, que declarou apoio ao sobrinho, os demais ex-vereadores e/ou atuais candidatos a Vereador que tiveram ou ainda têm cargos comissionados na Prefeitura de Buíque fazem parte do grupo político de Arquimedes Valença e já declararam apoio ao candidato a Prefeito da situação, Túlio Monteiro. O MDB e a Federação PSDB-Cidadania são partidos que integram a coligação Com o Trabalho Buíque segue Avançando, da qual o vice-prefeito buiquense faz parte.
Uma nomeação para cargo comissionado foi citada em uma das duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral movidas pela coligação União pela Mudança (da qual o candidato a Prefeito Jobson Camelo faz parte) contra Túlio Monteiro, sua vice na chapa Miriam Briano e o atual prefeito Arquimedes Valença.
Morzidai Lacerda Modesto de Albuquerque foi nomeado para ocupar o cargo de Diretor do Departamento de Transportes (vinculado à Secretaria Municipal de Obras) em julho deste ano. Tal nomeação foi apontada pela coligação União pela Mudança como uma forma de Arquimedes e Túlio cooptarem seus opositores políticos, a fim de que conseguissem mais apoio político na eleição marcada para o dia 06 de outubro.
Conforme divulgado ontem pela imprensa em geral e em nosso site, a Promotoria Eleitoral de Buíque disse, em seu parecer sobre a referida AIJE, concordar com os argumentos da coligação investigante a respeito do uso dos cargos comissionados pela Prefeitura de Buíque com finalidade eleitoreira. O parecer ainda será avaliado pelo Juiz Eleitoral da 60ª Zona Eleitoral de Buíque, que pode acatar ou não os pedidos apresentados pelo Ministério Público sobre o assunto. Não há data para que saia uma decisão.
Já havíamos trazido na segunda-feira uma matéria falando sobre uma decisão do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco que multou Arquimedes Valença em mais de R$ 11 mil por pouco mais de 300 contratações temporárias consideradas irregulares pelo órgão, feitas em 2022. Nessa decisão, uma das irregularidades apontadas foi justamente a contratação de pessoal para cargos de confiança por meio da previsão de contratações temporárias, o que é proibido por lei. Ficou determinado também que a Prefeitura de Buíque demita todos estes contratados de forma irregular até o dia 12 de novembro e que, no mais tardar, até março do ano que vem tenha feito um levantamento para fins de realização de concurso público, com o objetivo de preencher devidamente as vagas ociosas no serviço público buiquense.