Os pequenos precisam ter contato com o máximo de opções possíveis para que possam escolher a modalidade de sua preferência e manter o hábito na idade adulta |
Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein
Não é novidade que a prática regular de atividade física contribui para a prevenção de uma série de doenças crônicas não transmissíveis, entre elas diabetes, hipertensão e alguns tipos de câncer, além de reduzir o risco de eventos cardiovasculares, como infarto. Movimentar-se também é essencial para a prevenção de sobrepeso e obesidade, um problema cada vez mais comum entre crianças e adolescentes no mundo todo.
Em 2018, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou o plano global Let’s be active (Vamos ser ativos) para estimular a prática de exercícios e reduzir a prevalência do sedentarismo entre adolescentes e adultos em 10% até 2025 e em 15% até 2030. Em relação à obesidade infantil, o Ministério da Saúde aponta que 12,9% das crianças brasileiras entre 5 e 9 anos têm obesidade, assim como 7% dos adolescentes na faixa etária dos 12 aos 17 anos.
Mas escolher a melhor atividade física para os filhos nem sempre é uma tarefa simples. Muitos pais ficam em dúvida sobre qual exercício é o mais recomendado para a criança e, às vezes, acabam impondo a prática de esportes que eles gostam, sem levar em consideração o gosto dos pequenos. “A melhor atividade física para a criança é aquela de que ela gosta”, resume o ortopedista pediátrico Nei Botter Montenegro, da Clínica de Especialidades Pediátricas do Hospital Israelita Albert Einstein e do Instituto de Ortopedia do Hospital das Clínicas de São Paulo. Para que isso aconteça, a criança precisa ter contato com o máximo de opções possíveis.
Em crianças e adolescentes, a prática de exercícios proporciona benefícios como melhora da aptidão física, além de vantagens em índices cardiometabólicos, ósseos e cognitivos. Contribui também para evitar a obesidade, melhorar o desempenho acadêmico e a função executiva e ainda aliviar sintomas de depressão. De acordo com Montenegro, quando a criança é exposta a uma atividade física ou a um esporte desde cedo, muito provavelmente ela vai gostar de fazer aquilo, introduzir a prática em sua vida e continuar como uma pessoa ativa na idade adulta.
“Se a obrigamos a fazer uma atividade que ela não tenha prazer, pode desanimar, desistir e deixar de fazer outras modalidades pela experiência frustrante naquele esporte que não agradou. Isso pode ter um impacto negativo, resultando no abandono da atividade e no desincentivo à atividade física, mesmo na idade adulta”, alerta o médico.
Para meninas, atividades terrestres
Segundo Montenegro, as meninas devem ser incentivadas desde pequenas a praticar atividades físicas terrestres para melhorar o ganho de massa óssea e, com isso, evitar osteoporose na idade adulta. Isso porque elas terão uma vida hormonal mais curta que a dos meninos. “Pode ser dança, algum esporte de quadra ou o que quiser. Isso é necessário porque existe um ganho de massa óssea proporcional à atividade que a criança fizer”, explica o ortopedista.
Montenegro cita um estudo realizado no Japão em que pesquisadores compararam as atividades físicas praticadas por crianças que viviam na cidade com as que habitavam zonas rurais no país. O grupo que mais ganhou massa óssea foi o da cidade, justamente porque caminhava mais.
“No Japão, eles têm o conceito walk to school [“andar para a escola”]. Essa era a única diferença entre os grupos. As crianças da cidade iam a pé para a escola, enquanto as da zona rural iam de ônibus por ser muito longe. Ao final do estudo, a massa óssea das crianças que caminhavam era 20% maior do que as do campo”, relata.
Alongamentos ajudam a evitar lesões
Outro fator importante para atividades físicas e esportivas em crianças e adolescentes é a prevenção de lesões. Estatisticamente, a ginástica artística, o atletismo e as lutas marciais são as modalidades com maior número de lesões, segundo Montenegro. Machucados também são frequentes em esportes com maior impacto ou contato físico, caso de futebol, boxe, handebol e basquete.
A principal recomendação para evitar lesões é fazer o aquecimento muscular por pelo menos 10 minutos antes do início das atividades esportivas, assim como o alongamento. “O alongamento é fundamental e muitas crianças e adolescentes não o fazem antes de começar uma atividade. Muitas vezes, os próprios educadores físicos não avaliam a necessidade isso”, alerta o ortopedista, ao frisar a importância de passar por uma avaliação com um profissional de saúde antes de começar qualquer tipo de modalidade.
O médico também faz um alerta sobre os excessos, que podem levar ao aumento de lesões. De acordo Montenegro, se os esportes forem somente por lazer, sem competição, não existe limite de dias ou horas para a prática. Mas, se a criança ou o adolescente estiver treinando para ser um atleta, a recomendação é manter uma frequência de, no máximo, três treinos por semana, acrescidos por um dia de competição, com intervalo de um dia entre eles para a recuperação física. “Muitas crianças são incentivadas em excesso pela família, determinando um exagero no número de dias e de modalidades praticadas”, observa.
E a musculação?
Outra dúvida comum dos pais é sobre a prática de exercícios para ganhar força, popularmente chamados de musculação. Segundo Montenegro, adolescentes podem fazer esses exercícios, mas sempre com supervisão de um profissional de educação física, após a realização de alongamento e, preferencialmente, apenas com o peso do corpo.
“A criança e o adolescente estão em fase de crescimento. Eles possuem algumas porções dos ossos chamadas apófises, que são áreas de crescimento onde o osso está aumentando para receber músculos fortes. Nessas áreas, existe uma chance maior de haver uma lesão. Por isso é importante ser acompanhado por um profissional”, frisa.
O ideal para cada idade
Veja as atividades mais indicadas por faixa etária:
De zero a 2 anos: nessa fase, o bebê está em pleno desenvolvimento neuromotor. Ela começa a andar entre 9 e 18 meses (em média, aos 12 meses), mas ainda não fará atividade esportiva. A escolha da modalidade deve ser baseada priorizando o desenvolvimento individual, com caráter lúdico, como uma brincadeira. Um bom exemplo é colocar o bebê de barriga para baixo e estimulá-lo a rolar ou fazer aquela antiga brincadeira “serra, serra, serrador, serra o papo do vovô”.
A natação para bebês pode ser iniciada antes do primeiro ano de vida, mas não como esporte e sem a pretensão de que a criança nade. Importante: sempre com supervisão dos adultos. “A criança vai ter condição de aprender a nadar de verdade a partir dos 3 ou 4 anos”, pontua Montenegro. “A partir daí ela terá a capacidade eventual de sair de um afogamento, porque estará com uma melhor coordenação motora. Mas nem por isso vamos deixar uma criança sozinha dentro da água.”
Dos 2 aos 5 anos: nessa fase, as crianças começam a desenvolver pequenas habilidades: aprendem a correr, pular, brincar de pega-pega e esconde-esconde. Em geral, já frequentam a escola e começam a praticar aulas mais regulares, como judô e balé. Apesar de ainda terem a habilidade motora limitada (com reações de equilíbrio pouco definidas), o aprendizado acontece por erros e acertos.
“Por exemplo: a criança não entende as regras para jogar futebol, mas ela entende que precisa chutar e correr atrás da bola. Uma hora ela vai acertar o gol e vão comemorar. Nessa idade ela compreende instruções simples, mas sempre com aspecto de brincadeira”, explica Montenegro. Ele ressalta que o ideal é enfatizar as habilidades fundamentais da criança, evitando a competitividade e priorizando o desenvolvimento individual.
Crianças de 6 a 9 anos: ocorre a melhora do equilíbrio e das reações automáticas. Segundo Montenegro, os esportes praticados com regras flexíveis são mais bem aceitos, o que permite a prática no tempo livre das crianças, com poucas instruções e mínimo de competição.
Começam a ser indicadas escolinhas de futebol, esportes de quadra, judô e natação. “A criança começa a entender melhor as regras, como o que é uma falta, o que ela pode ou não fazer em campo. Elas têm o pulmão pequeno, então não têm capacidade aeróbica para correr um campo inteiro de futebol, por exemplo, mas com pequenas adaptações são capazes de aprender a jogar basquete, vôlei, handebol”, orienta o ortopedista.
Crianças de 10 a 12 anos e adolescentes: a habilidade motora melhora, e a criança desenvolve estratégias em grupo para praticamente todos os esportes coletivos de quadra, tênis, artes marciais e outras modalidades. É nessa fase que ela entende melhor as regras do jogo e a tática (como em que lugar deve ficar no campo para receber a bola e atingir o objetivo do jogo). “A criança passa a compreender a função dela num time. Como ela já foi exposta a várias atividades, nesse momento ela vai, talvez, escolher um esporte para se dedicar e se especializar, de acordo com seu gosto e seu desempenho”, afirma o médico.
Fonte: Agência Einstein