EXCLUSIVO: JUSTIÇA NEGA RECURSO E MANTÉM MULTA DO TCE A ANDRÉ DE TOINHO

 

Tribunal de Contas do Estado havia julgado suas contas, enquanto era Presidente da Câmara de Vereadores de Buíque, irregulares. Multa de R$ 20 mil, bem como restituição de R$ 5 mil aos cofres do município do agreste, foi contestada pelo político, mas decisão da Câmara Regional de Caruaru manteve penhora dos bens para quitação do débito. Inelegibilidade dele também foi mantida com rejeição do recurso.  

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A Desembargadora Valéria Bezerra Pereira Wanderley, da 2ª Turma da Câmara Regional de Caruaru, negou no último dia 05 de janeiro um recurso de André de Araújo Beserra, mais conhecido como André de Toinho, contra uma decisão judicial que prevê a penhora de seus bens para o pagamento de uma multa aplicada a ele pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco em 2017. Nesta matéria exclusiva, o Podcast Cafezinho com William Lourenço traz mais detalhes tanto do processo de penhora quanto do processo do TCE que originou esta multa. Lembrando que as informações aqui trazidas são públicas e foram obtidas por meio dos portais de Consulta Processual Unificada do Tribunal de Justiça de Pernambuco e de Pautas e Julgamentos do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (ambos podem ser acessados por qualquer cidadão).


HISTÓRICO DA MULTA DO TCE

André era Presidente da Câmara de Vereadores de Buíque, no agreste, em 2013 e teve as prestações de contas daquele exercício financeiro da Casa Legislativa julgadas irregulares pela Primeira Câmara do TCE em 2017. Segundo consta na decisão (vale lembrar, acessível a qualquer cidadão: basta clicar aqui e digitar na pesquisa o número de processo 1470105-4), o Relatório de Auditoria produzido pela equipe técnica do TCE apontou as seguintes irregularidades, com seus respectivos responsáveis:

- não publicação da Prestação de Contas no site da Câmara; excessivas nomeações para cargos comissionados sem características de direção, chefia e assessoramento, burlando assim a obrigação de fazer concurso público para o preenchimento destas vagas; não recolhimento integral da contribuição patronal e dos servidores da Câmara ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS); remessa dos dados do Módulo de Execução Orçamentária e Financeira fora do prazo e remessa dos dados do Módulo de Pessoal fora do prazo (responsável apontado pelo TCE: André de Toinho);

- Receita Corrente Líquida informada pela Câmara diferente da apresentada pelo Executivo (responsáveis apontados pelo TCE: André de Toinho e José Antônio Silva, então representante da ALCAM- Assessoria Legislativa, Contábil e Administrativa Municipal);

- participação de servidora comissionada em processos de licitação e inobservância de procedimentos exigidos em licitações (responsáveis apontados pelo TCE: André de Toinho, Osvaldo Vale de Godoy Neiva- então assessor jurídico da Câmara, e três integrantes da Comissão Permanente de Licitações: Janaina de Albuquerque Feitosa, Glaucia Lúcia de Moura França e Vera Lúcia da Silva Araújo);

- montagem de processo licitatório, na modalidade convite, para prestação de serviços similares (responsáveis apontados pelo TCE: André de Toinho, Osvaldo Vale de Godoy Neiva- então assessor jurídico da Câmara, e três integrantes da Comissão Permanente de Licitações: Janaina de Albuquerque Feitosa, Glaucia Lúcia de Moura França e Vera Lúcia da Silva Araújo, além do licitante Paulo Roberto Coutinho Serrão); e

- realização de gastos indevidos com locação de veículos, cuja propriedade não é da empresa contratada (responsáveis apontados pelo TCE: André de Toinho e a empresa R. Souza Empreendimentos Ltda.).

Tais irregularidades, para os auditores, somaram um valor total passível de devolução de R$ 137 mil.

Além disso, enquanto Presidente da Câmara de Vereadores, André de Toinho ultrapassou os limites legais de:

- subsídio dos vereadores: enquanto o limite legal era de R$ 7.395,00 (sete mil, trezentos e noventa e cinco reais), eles receberam de salário mensal R$ 8.016,94 (oito mil e dezesseis reais e noventa e quatro centavos);

- despesa total do Poder Legislativo: enquanto o limite legal era de 5% do somatório das receitas da Câmara, o percentual aplicado no ano em questão ficou em 7%. Fora que o gasto com folha de pagamento ficou somente 0,01% abaixo do limite legal de 70% de todos os repasses à Câmara.

A então relatora do processo no TCE, Conselheira Teresa Duere (que se aposentou no ano passado), entendeu que Osvaldo Vale de Godoy Neiva não poderia ser responsabilizado pelos atos praticados por ele enquanto assessor jurídico, por estes não terem sido atos de erro grosseiro, má-fé ou dolo; e acatou a preliminar apresentada por ele.

Quanto às irregularidades apontadas no Relatório de Auditoria, a relatora acompanhou o Ministério Público de Contas e decidiu que:

- sobre a não publicação da Prestação de Contas de 2013 no site da Câmara, a defesa de André de Toinho informou no processo que o endereço eletrônico da Câmara de Vereadores havia mudado e que no novo site, estava constando as informações desta prestação de contas a qualquer cidadão. A falha na comunicação com o TCE sobre essa alteração foi relevada;

- sobre as excessivas nomeações, em 2015, a Câmara de Vereadores já havia sido avisada numa Auditoria Especial realizada naquele ano que teria que tomar medidas para ajustar a desproporcionalidade entre o seu quantitativo de cargos comissionados e efetivos, mantendo a regularidade com ressalvas neste assunto;

- sobre a divergência na Receita Corrente Líquida apresentada pela Câmara, por ter mantido suas despesas de pessoal abaixo do limite legal, essa falha de informação se tratou de mero equívoco que não causou prejuízo ou descumprimento da lei, cabendo aqui apenas uma recomendação;

- quanto aos não recolhimentos ao RPPS, foi apontada uma diferença entre a contribuição patronal devida e recolhida de mais de R$ 22 mil que, após nova análise, ficou em pouco mais de R$ 9 mil. Aqui, foi aplicada multa a André de Toinho e uma recomendação do TCE;

- sobre a remessa de dados do Módulo de Pessoal e do Módulo de Execução Orçamentária e Financeira, foi constatado que houve um atraso no envio destes dados somente no mês de agosto de 2013, cabendo aqui uma recomendação;

- sobre a participação de servidora comissionada em processo de licitação, os auditores do TCE apontaram que Maria das Graças Silva Mateus, que era comissionada da Câmara, participou de duas licitações: uma delas como sócia de uma empresa, a MS Mateus & Cia Ltda.- ME, conflitando diretamente com a Lei de Licitações que estava em vigor à época (Lei Nº 8.666/93, que foi revogada em 30 de dezembro do ano passado pela Lei Nº 14.133/2021). Foi defendida a tese de que, embora tivesse participado dos processos, ela não venceu nenhum, não causando nenhum prejuízo para a Câmara. Uma multa foi aplicada aos responsáveis;

- sobre a inobservância de procedimentos exigidos em licitações, foram analisados três processos licitatórios. As irregularidades apontadas neste tópico se resumiram às ausências das certidões negativas dos licitantes, cabendo apenas uma determinação por parte do TCE;

- sobre a montagem de processo licitatório na modalidade convite (no qual participou como licitante o senhor Paulo Roberto Coutinho Serrão), foram observadas diversas evidências de simulação nas documentações de três processos licitatórios, com alguns destes documentos sendo inseridos após as realizações destes processos. Diz o processo (PL é sigla para Processo Licitatório):

"A questão que se coloca é: qual ou quais empresa (s) foi a responsável pela realização dos serviços? A premissa da auditoria foi: tendo em vista que os serviços referentes aos PL 004 e 006/2013 estarem contemplados no PL 001/2013 então os PLs 004 e 006/2013 foram forjados sem que as empresas contratadas nesses dois últimos processos tivessem realizado qualquer serviço. Ocorre que essa não é a única hipótese, havendo outras a serem observadas, por exemplo, o caso de as empresas contratadas pelos PLs 004 (Sr. Paulo Roberto Coutinho Serrão) e 006 (Sra. Elayne Anny Velez Silva) terem executado os serviços a elas contratados e a empresa ALCAM (PL 001/2013) apenas reduzido de seu escopo esses serviços e realizado os demais previstos em contrato, sem diminuição da remuneração (...)

Além disso, deve-se observar que os pagamentos apontados pela auditoria como realizados de forma fraudulenta estão fundamentados em Notas Fiscais cuja pessoa que as atesta não foi apontada pela auditoria como corresponsável, não havendo, em decorrência disso, a notificação da mesma. Nesse contexto, não faria sentido exigir-se a restituição dos valores às empresas do Sr. Paulo Roberto Coutinho Serrão e Sra. Elayne Anny Velez Silva, devendo salientar-se que esta última também não foi notificada para apresentação de defesa, o que, de plano afasta a possibilidade de ser responsabilizada, sem oportunidade de defesa. Além disso, apesar de haver, conforme antedito, uma zona de intersecção entre os objetos dos processos licitatórios, existem elementos do Projeto Básico do PL 004 que não constam explicitamente no Projeto Básico do PL 001, especialmente os itens relativos à contabilidade pública que constam no PL 001 de forma genérica e no PL 004 de forma detalhada. Esse fato torna inviável ou ao menos extremamente complexa a quantificação de valores a serem devolvidos por cada uma das empresas".

Pelos fortes indícios de simulação apontados pela auditoria e pelo Ministério Público de Contas, a decisão aqui foi para julgar irregulares as contas, bem como multar André de Toinho e encaminhar estas informações ao Ministério Público de Pernambuco para averiguação;

- sobre os gastos indevidos com locação de veículos, foi constatado que embora o veículo objeto do contrato foi um Toyota Corolla, a empresa contratada na licitação não era dona deste veículo, mas sim José Antônio Silva: contador e sócio da empresa ALCAM (a mesma citada no item acima). A R. Souza Empreendimentos declarou no processo licitatório ter três veículos da marca FIAT, e recebeu da Câmara de Vereadores, entre janeiro e dezembro de 2013, um montante de R$ 65.500,00 (valor médio de um Corolla, segundo a Tabela FIPE daquele período, e R$ 5 mil a mais do que estava previsto em contrato). Por conta disso, foi determinado ao então gestor André de Toinho restituir os R$ 5 mil pagos a esta empresa para os cofres públicos da Câmara de Vereadores, bem como pagar uma multa.

Resumindo a decisão: a prestação de contas de 2013 da Câmara de Vereadores de Buíque foi julgada irregular pelo TCE, tendo André de Toinho sido multado em R$ 20 mil por todas as irregularidades apontadas, bem como obrigado a restituir os cofres públicos em R$ 5 mil.

Além dele, as então integrantes da Comissão Permanente de Licitações (Janaina de Albuquerque Feitosa, Glaucia Lúcia de Moura França e Vera Lúcia da Silva Araújo) foram multadas em R$ 10 mil cada.


QUESTIONAMENTOS NA JUSTIÇA

Em dezembro de 2017, a Vara Única da Comarca de Buíque havia determinado a penhora dos bens de André de Toinho para que a multa do TCE fosse integralmente paga.

Quase cinco anos depois, em março de 2022, a defesa do político havia entrado com um pedido de exceção de pré-executividade neste processo. Trata-se de um instrumento de defesa que tem o objetivo de demonstrar vícios processuais que levam à anulação do processo de execução. Como o próprio nome diz, é uma exceção à regra de entrar com embargos para se defender neste tipo de ação. Só que esta exceção é aceita somente em hipóteses específicas previstas na Súmula Nº 393, do Superior Tribunal de Justiça.

A juíza entendeu que a sanção imposta pelo TCE contra André de Toinho estava amparada na legislação vigente e rejeitou o pedido.

Coube a ele recorrer à Instância Superior: neste caso, a Câmara Regional de Caruaru. Em março do ano passado, a Primeira Turma do órgão declarou incompetência em julgar o recurso interposto pelo ex-vereador. Uma vez que o Estado de Pernambuco (onde o TCE está incumbido) é o polo passivo da ação, ela foi remetida à Segunda Turma da Câmara Regional de Caruaru.

No referido recurso, era pedido um efeito suspensivo à decisão da Comarca de Buíque para, assim, impedir a penhora dos bens de André de Toinho. Só que no dia 05 de janeiro deste ano, como já adiantado no início desta matéria, a Desembargadora Valéria Bezerra Pereira Wanderley negou este recurso, por entender que o chamado pressuposto recursal da tempestividade (o tempo legal determinado pelo Código de Processo Civil para que qualquer recurso a uma decisão judicial seja interposto) não foi preenchido, pois o prazo final para recorrer por meio do agravo de instrumento era até novembro de 2022. O recurso de André de Toinho foi interposto na Câmara Regional de Caruaru em fevereiro do ano passado.


OUTRAS IMPLICAÇÕES LEGAIS

André de Toinho ficou impedido de concorrer às eleições de 2020 por causa dessa multa do TCE e, em seu lugar, concorreu sua irmã Aline (que se elegeu vereadora).

A Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar Nº 64, de 18 de maio de 1990) diz em seu artigo 1º, no inciso I, alínea g, que são inelegíveis para qualquer cargo:

"os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição"
Isto significa que, com os recursos negados na Justiça e com o fato da decisão do TCE ter saído em 2017, ele ficará impedido de concorrer às eleições municipais deste ano, só se livrando das punições em agosto de 2025. O Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco entregará, até 15 de agosto, ao Tribunal Regional Eleitoral e ao Ministério Público Federal a relação com os nomes dos responsáveis que tiveram suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas, por decisão irrecorrível, nos 08 (oito) anos anteriores ao pleito deste ano, que ocorrerá em 06 de outubro.
William Lourenço

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