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Por William Lourenço
A Eleição Geral deste ano, que inclui a de Presidente da República, é a terceira em que participo como eleitor e a primeira como jornalista. E um dos pontos primordiais da campanha, além da propaganda no rádio e televisão, é o debate entre os candidatos.
Isso porque, entre eles, muitos pontos levantados por cada campanha podem ser colocados a limpo aos eleitores como verdades ou mentiras absolutas.
O Grupo Bandeirantes de Comunicação, como vem fazendo desde 1989 (e vale sempre creditá-los por isso), realizou na noite deste domingo o primeiro encontro entre alguns desses candidatos. Desta vez, contou com o UOL, Folha de São Paulo, TV Cultura e Google para a transmissão do evento, além das próprias emissoras de rádio e TV que o conglomerado da família Saad tem.
Como são doze candidatos ao todo, mas nem todo mundo lembra os nomes de todos eles, os seis melhores colocados nas pesquisas eleitorais (que, particularmente, vejo com muita desconfiança) foram convidados e estiveram presentes: o atual Presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), o ex-presidente Lula (PT), Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB), Luiz Felipe D'Ávila (NOVO) e Soraya Thronicke (União Brasil).
O embate mais esperado, sem dúvidas, era entre Lula e Bolsonaro. Para se sobressaírem na falta de argumentação quanto a propostas, ambos se sustentaram em apontar falhas um do outro.
O petista cometeu o mesmo erro da sabatina do Jornal Nacional, ao citar como feitos de seus mandatos (entre 2003 e 2010) a criação do COAF e da Lei Anti-Corrupção, em resposta às acusações do atual mandatário do Poder Executivo, que o chamou diversas vezes de presidiário. O COAF e a Lei Anti-Corrupção, vale ressaltar, foram criados em 1998, na gestão do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Lula também mentiu sobre suas absolvições na justiça: ele só recebeu a presunção de inocência quando o ex-juiz Sérgio Moro foi declarado parcial pelo STF. Não foi inocentado de coisa alguma, somente alguns dos processos movidos contra ele foram distribuídos em outras instâncias da justiça, o que o deixou, de acordo com a Lei da Ficha Limpa, apto a concorrer.
Bolsonaro, como já era de se esperar, não estava com a menor paciência: desde que chegou à sede da Band, no bairro do Morumbi, até a saída ríspida dos estúdios, sem cumprimentar nenhum dos candidatos nem conversar com os jornalistas. Aproveitou a oportunidade para dar aquela patada na jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura, notória crítica de seu governo e de sua pessoa. O ato foi visto como uma agressão pelas mulheres jornalistas que estavam no recinto, inclusive as candidatas. Dentre as convidadas a fazer questionamentos aos candidatos, estava a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de São Paulo, conhecida do presidente. Isso porque em 2020, ela fez uma reportagem denunciando um esquema de disparo em massa de mensagens que ocorreu nas eleições de 2018. Numa de suas idas ao chamado cercadinho, Bolsonaro falou pejorativamente que ela "queria dar o furo contra ele". A frase foi entendida como um ataque à honra de Patrícia, que o processou e ganhou na Justiça de São Paulo. A jornalista e o presidente não se encontraram na TV Bandeirantes.
Também ganhou destaque, mas de forma negativa pra mim, as sucessivas falhas de áudio que ocorreram durante as mais de duas horas de debate. Um grupo que tem como carro-chefe uma emissora de rádio do calibre da Bandeirantes não pode falhar nunca nesse quesito.
Na vez do embate entre Lula e Ciro Gomes, chamou a atenção a invertida que o petista tomou de seu ex-ministro da Integração Nacional: após ouvir as críticas do pedetista sobre seus mandatos e seu discurso, o petista usou o fato dele ter ido pra Paris após a confirmação do segundo turno entre Fernando Haddad e Jair Bolsonaro, à época do PSL. Quando Lula disse que ele, pelo menos, não fugiu pra capital francesa, o Ciro Gomes que a gente conhece retrucou: "Você tava preso". Um momento pra se guardar, e até rir.
Também teve a apresentação em maior escala nacional de Soraya Thronicke que, embora senadora por Mato Grosso do Sul e lembrada por alguns pela CPI da COVID, surgiu como candidata substituta a toque de caixa do União Brasil à presidência após o cacique do partido, Luciano Bivar, desistir e resolver tentar mais um mandato de deputado federal aqui por Pernambuco. Formada em Direito, sua família é proprietária de uma famosa rede de motéis em seu estado. Pela sua postura raivosa e de poucos amigos, recebeu na internet a alcunha de Juma, personagem da novela Pantanal (atualmente com um remake exibido na TV Globo). Ela também falou que, pelo que sabia e estaria disposta a falar no debate, precisaria de segurança reforçada. Estamos esperando até agora, Soraya.
Sua conterrânea e colega de Senado, Simone Tebet (MDB), também foi vista com bons olhos pelos eleitores que acompanharam e repercutiram em tempo real ao debate. Tanto por suas críticas ao presidente Bolsonaro (e isso vem desde a CPI da COVID também), até um momento em que ela desceu o pau nos próprios correligionários, sobretudo os que, segundo ela, tentaram abafar sua candidatura e até ficar do lado do Lula. Geddel Vieira Lima, Eunício Oliveira e Renan Calheiros, notórios acusados de corrupção que são filiados a este partido, são exemplos. O ato falho da Tebet foi quando, ao dizer que era feminista, disse que "o Brasil precisava de uma mulher pra arrumar a casa". Coisa que as ditas feministas querem distância.
Luiz Felipe D'Ávila (NOVO) quis se apresentar aos eleitores como uma pessoa igual a eles. O problema no discurso, que visa aproximá-lo daqueles mais humildes reféns de populistas como Lula e Bolsonaro, é que seu patrimônio é de somente R$ 24 milhões. Quantos têm isso de patrimônio? Nem eu sou igual a ele nesse aspecto. E pelo visto, nem os demais candidatos: D'Ávila é o presidenciável mais rico, de acordo com os bens declarados à Justiça Eleitoral. E a esposa dele é somente filha do Abílio Diniz. Mas tirando isso, sua postura foi basicamente a mesma dos demais: mostrar as falhas do ex e do atual presidente, com o bônus de defender o liberalismo econômico e um Estado cada vez menor. Com o Ciro Gomes, curiosamente, ele teve mais cortesia.
Já em outro estúdio, a chamada Sala Virtual, o deputado federal André Janones e o ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, resolveram se bater. Janones, apoiador de Lula, e Salles, apoiador de Bolsonaro, representaram com perfeição os eleitores destes dois candidatos e a maldita polarização que ambos criaram e alimentam dia após dia.
E vale dar o devido crédito ao Ciro Gomes (PDT). Fora o escape na invertida pro Lula, ele se conteve de uma forma nunca antes vista em suas outras três candidaturas a Presidente. Quando provocado pelo Bolsonaro, sobretudo numa fala considerada machista de duas décadas atrás, ele conseguiu se conter e reverter de forma inteligente, de modo que quem ficou mal na fita foi o candidato à reeleição. Ao ser cutucado pelo Lula, fez o mesmo: inverteu e, perto dele, o petista saiu pior.
Todos, menos os polarizadores do PT e do PL, foram ao debate para tentar apresentar suas propostas de governo nas áreas em que eram questionados.
Lula e Bolsonaro, infelizmente, apresentaram discursos pobres de propostas e se dedicaram unicamente a atacar um ao outro quando tinham o direito de falar e a incomodar os jornalistas pedindo direito de resposta toda hora, quando se sentiam ofendidos com o que um falava do outro.
Fica cada vez mais claro que todos aqueles que os apontam como únicas opções de voto estão mentindo de forma descarada e dolosa. É fato que, pela tradição de altos índices de abstenção em torno de 20% do eleitorado a cada pleito (mesmo o voto sendo obrigatório), pela desconfiança que os brasileiros têm com a classe política (pelo menos 78% declararam que não confiam nessa classe de jeito nenhum, segundo o Instituto da Democracia e da Democratização na Comunicação), pelo fato de doze estarem na disputa e pelos muitos motivos que eles dão para que haja tamanha desconfiança, além dessa forçação de barra de grandes veículos de comunicação (tanto à direita quanto à esquerda, cada um manobrando sua própria massa de idiotas) nessa retórica do nós contra eles, nem um nem outro tem a menor possibilidade de se eleger (ou se reeleger) no dia 2 de outubro com uma ampla vantagem, como Bolsonaro insiste em dizer que será. E se não for, a eleição vai estar inquinada, como diria o Abel Ferreira. Mesma coisa do Lula: ou você acha que, se ele perder pro capitão, vai aceitar sem fazer o mesmo barulho perante o sistema eleitoral?
A grande questão é quem os (vou chutar) 100 milhões de eleitores, que realmente votarão em alguém, vão colocar como os dois candidatos pro segundo turno em 30 de outubro. Quem tem o mínimo de inteligência sabe que tem não só duas opções, mas outras quatro, até mesmo dez.
Hoje ficou muito claro. Nunca foi tão fácil escolher. Nem Lula, nem Bolsonaro: é tudo a mesma merda! E é só isso!