OPINIÃO: CERTAS IDEIAS PRECISAM SER "ABORTADAS"

 

Foto de Emma Guliani para o Pexels

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Por William Lourenço


Estava planejando uma folga nesse período de Festas Juninas, incluindo uma pausa nas publicações aqui pelo site até o dia primeiro, só que dados os absurdos que ocorreram nesta última semana, e a me vendo obrigado enquanto jornalista, aqui estou escrevendo mais uma Coluna de Opinião.

Uma menina de 11 anos, em Santa Catarina, foi estuprada e acabou engravidando. A mãe dela procurou a Justiça para que o aborto fosse realizado, o que é permitido por lei. Só que a juíza responsável pelo caso simplesmente manteve a menina num abrigo e tentou, de todas as formas possíveis, convencê-la a ter a criança mesmo assim e até a citar o estuprador como "pai". Vou repetir: uma JUÍZA (com letras maiúsculas, pra que vocês vejam que se trata de uma mulher) pegou o caso de uma menina estuprada e quis lhe negar o aborto, mesmo a lei dizendo claramente que deveria ser feito. Após a repercussão negativa desse caso, o procedimento foi realizado e a juíza tomou um chá de sumiço da mídia (dizem que ela até foi promovida).

Agora, vamos pegar o avião e ir para os Estados Unidos, onde a Suprema Corte de lá revogou uma decisão do próprio tribunal de 1973 que dava o direito constitucional às mulheres de abortar, não importa a condição em que a gestação se apresente. Essa decisão conservadora não deixa de ser reflexo da gestão de Donald Trump, que indicou três dos atuais nove ministros da corte e que votaram pela derrubada da decisão. Agora, pelo menos 26 dos 50 estados americanos poderão proibir legalmente o procedimento (cada estado americano tem autonomia para fazer leis próprias sobre esse assunto).

E retornando ao Brasil, nos deparamos com a história da atriz Klara Castanho, que teve de revelar que foi estuprada, que engravidou por conta desse ato, que não pôde abortar e que, após o nascimento da criança, a doou para adoção. Ela teve de falar sobre isso porque, poucas horas antes, o colunista Léo Dias e a youtuber Antônia Fontenelle haviam falado sobre isso, sem a autorização da atriz de 21 anos.

Agora sim, vamos à minha opinião, já que este espaço é meu e estamos em uma democracia.

Em todos estes casos, onde o aborto é o tema central, a discussão foi a mesma: rasa, idiota e às vésperas de uma eleição presidencial.

Os ditos representantes da direita aqui no Brasil, como falsos moralistas que são, chegaram a falar no caso da menina de Santa Catarina que ela estaria errada em querer abortar, com aquele discurso da defesa da vida, da maternidade e de outras baboseiras que você já está cansado de ouvir. Eles queriam que a menina de 11 anos, estuprada, simplesmente se virasse em cuidar do bebê fruto de um estupro. Me espanta esses mesmos ainda não terem, publicamente, dito que são a favor do estupro. Aí, ainda botam religião no meio e tudo vira uma imoralidade desnecessária. Aborto aqui de jeito nenhum, nem se a lei prever no caso de um crime.

A esquerda, pra variar, defende a liberação geral do aborto: além desses casos citados, também naqueles em que a mulher simplesmente não quer o bebê. Essa visão também é imoral, por tornar a gestação (e me refiro aqui às resultantes de relações sexuais consentidas entre ambas as partes) uma coisa descartável. Pra que criaram tantos métodos contraceptivos, como a camisinha ou a pílula do dia seguinte? Não é mais fácil, nestes casos, prevenir do que abortar? A impressão que me passa aqui é que a galera que quer "liberar geral" quer transar, quer gozar, sabe que isso pode resultar num bebê (até porque o sexo foi feito para fins, inicialmente, reprodutivos), mas quando a união do espermatozoide com o óvulo ocorre, quer simplesmente descartar, fugir dessa responsabilidade biológica.

Eu, William Lourenço, este que vos escreve, sou a favor do aborto nos casos que estão especificados na lei, mais precisamente em nosso Código Penal: em gestações resultantes de estupro e em casos onde a mãe corra risco iminente de vida. Fora isso, eu não consigo ver com bons olhos, muito por conta do que dizem aqueles que querem ficar em um lado, tanto os totalmente contra quanto os totalmente a favor.

No caso da Klara, ela não teve o devido respaldo para fazer o aborto (mesmo a lei dizendo que poderia), teve de levar sua gestação até o final e depois disso, doou o bebê pra adoção. Dá pra acreditar que a mesma direita imunda que defendeu que a menina de 11 anos mantivesse a gravidez, atacou a atriz por ela ter colocado o bebê, fruto de um estupro, para adoção? No fundo, essas pessoas defendem o estupro.

A atitude dela, a meu ver, foi a mais sensata possível, dado todo o trauma que ela deve ter passado e que ainda passa. E outra: existe uma disparidade gigantesca entre pessoas que querem adotar uma criança e crianças que esperam ser adotadas. Ela não era obrigada, em hipótese alguma, a estar com essa criança, repito, fruto de um estupro: que, a quem ainda não sabe, se trata de um ato sexual forçado, sem o devido consentimento da outra pessoa.

E o que mais me enoja é que temas como esse só surgem em véspera de período eleitoral. A discussão sobre o que pode ser feito fica pra último plano: esquerda e direita travam uma batalha comportamental. O "vamos todos dar a bunda contra vamos todos ter uma arma" se transforma em "todo mundo tem que fazer aborto contra ninguém vai fazer aborto".

Até porque, no caso do aborto, por alguns dizerem se tratar de uma questão de saúde pública, não citam como que esses procedimentos podem ser mais acessíveis e feitos de forma mais segura, como o Estado poderia participar disso... Só ficam nessa disputa ideológica e patética de moral religiosa (que os direitistas não seguem) versus o direito pleno das mulheres fazerem o que quiser com seus corpos (que nem os esquerdistas acreditam de verdade).

Por outro lado, esses mesmos também não propuseram nada de concreto pra coibir, por exemplo, os crimes de estupro (disparadamente, os maiores responsáveis por gestações indesejadas que farão as mulheres procurarem clínicas de aborto).Tá vendo como ninguém liga pra isso?

Mais uma vez, um assunto delicado (o mesmo, diga-se de passagem) foi usado como cortina de fumaça numa eleição presidencial. E brasileiro é um ser tão desgraçado que prefere tacar pedra em quem já está ferido do que dar o braço a torcer e admitir que, enquanto sociedade, erramos.

Vou terminar aqui, antes que, em vez de uma Coluna de Opinião, eu comece a xingar todo mundo.

William Lourenço

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