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Por William Lourenço
A eleição presidencial de outubro aqui no Brasil vai se moldando como a pior de todos os tempos, por diversos motivos, mas para ser breve, destacarei somente um: o mais óbvio, pelos candidatos.
O atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), busca sua reeleição. Seu primeiro mandato foi coberto por tensões desnecessárias com os demais poderes da República, intrigas idiotas com ministros do STF (sobretudo Alexandre de Moraes), pura burrice e mau caratismo nas ações de combate à COVID-19 no país (que matou mais de 650 mil pessoas) e na demora da aquisição de vacinas (dando protagonismo a governadores e prefeitos)... E não bastasse isso, todo e qualquer lampejo de boa ação feita por ele neste mandato foi simplesmente afundado pelas suas próprias contradições: prometeu uma coisa na campanha, fez o contrário quando eleito. A ida ao Centrão foi só uma delas... Nem vou falar das tentativas de blindar os filhos de operações da Polícia Federal, Queiroz e companhia...
A revolta, e até rejeição, de muitos com Bolsonaro é porque ele havia sido eleito em 2018 como uma nova alternativa, a esperança (ainda que ilusória, já que ele tinha sido deputado federal por sete mandatos consecutivos) de livrar o país das mãos daquele que havia se tornado o maior ladrão da República: Luís Inácio Lula da Silva (PT), condenado por causa da Operação Lava Jato, então liderado pelo juiz Sérgio Moro, que virou depois Ministro da Justiça de Bolsonaro e saiu denunciando o Presidente por tentar coagir a Polícia Federal a não avançar em investigações contra seu filho...
O homem que teve sua candidatura impugnada há quatro anos atrás e fortaleceu o nome do desconhecido Bolsonaro, a ponto de elegê-lo Presidente da República, reverteu a maioria das condenações que teve na Justiça. Em que sentido?
Sergio Moro se lascou ao virar Ministro da Justiça após a eleição de Bolsonaro. A defesa do ex-presidente usou este fato como atestado de parcialidade e apresentou às instâncias superiores dizendo o seguinte: ele julgou e condenou nosso cliente, já tendo um lado definido. Não viu todas as provas, pegou somente as que eram convenientes a ele e deu sua sentença baseado em interesses pessoais.
O STF decidiu que, sim, Moro foi parcial e que todos os processos abertos contra Lula deveriam voltar à estaca zero. A condenação que o impediu de se candidatar em 2018 deixou, em tese, de existir. Foi lhe dada a presunção de inocência (que é completamente diferente da absolvição: aqui não há condenação, ainda está na fase de se presumir que ele possa ser inocente, a menos que as investigações e provas coletadas provem o contrário). Os processos simplesmente retrocederam e hoje se encontram na fase inicial, a de investigações. E foram vinte e cinco processos.
Fizeram pedido à ONU sobre a parcialidade de Moro (que, pelo quase nada que entendo de Direito, não serve pra bosta nenhuma), transformaram num show midiático e, de forma salafrária, mentiram ao dizer que Lula foi vitima de um golpe e que ele é inocente. Por causa disso, mesmo solto, Bolsonaro segue forte no pleito.
Mas, da mesma forma que o petista dá força ao Capitão, as cagadas feitas por Bolsonaro dentro de seu mandato, no que diz respeito à administração do país, dão força ao nome de Lula: comida mais cara, gás de cozinha mais caro, tudo de básico à subsistência cada vez mais caro... A maioria do eleitorado, de classes sociais mais baixas, sempre se prendeu a esses fatores na hora de escolher um candidato. Aí o Lula e o PT recorrem a memórias distorcidas dos tempos em que estiveram no poder (entre 2002 e 2016), onde falam de comida na mesa, água no sertão, dança da motinha, pra reforçar que somente com eles o Brasil voltará a sorrir. No entanto, esquecem do Mensalão, do Petrolão, do desastre da gestão de Dilma Rousseff (colocada como sucessora do Lula e depois retirada do poder pelo impeachment) e toda a desgraça social, econômica, moral e política subsequente que também ocorreu neste período. Por isso, a rejeição ao Lula continua grande e dificilmente diminuirá, a menos que o povo enlouqueça e, no dia 2, vote do nada em um candidato aleatório com um número mais fácil de ser digitado na urna (tão questionada por Bolsonaro, mesmo tendo sido eleito por ela em 2018). Aí entra Ciro Gomes (PDT).
Ele, que já foi de tudo um pouco (deputado federal, deputado estadual, governador, prefeito e ministro), é verdadeiramente o único candidato que jamais respondeu a qualquer processo na justiça por corrupção, mesmo tendo ocupado tantos cargos públicos em mais de 40 anos na política. No entanto, seu temperamento explosivo e sua sinceridade, sobretudo ao falar dos seus colegas de classe, já lhe renderam mais de 80 processos por danos morais (basicamente, alguém se ofendeu com o que ele falou e o acusou de calúnia e difamação). Bolsonaro foi um dos que já processaram Ciro.
Numa entrevista à Rádio Jovem Pan, em 2019, Ciro disse que Bolsonaro fez lavagem de dinheiro ao receber uma doação de R$ 200 mil do seu então partido, o PP. O curioso é que a queixa foi retirada por Bolsonaro semanas depois de Ciro ter virado réu.
E de processos, Ciro entende também pelo fato de ser formado em Direito pela Universidade Federal do Ceará, tendo sido professor universitário, com uma passagem pela Universidade de Harvard (Estados Unidos). Até comentarista esportivo numa rádio do Ceará ele já foi.
Com a desistência de João Doria da pré-candidatura pelo PSDB, Ciro Gomes continua sendo o nome mais forte (e o mais resistente) da famigerada "terceira via": alguém que pode ter alguma chance de confrontar os polarizadores da esquerda e da direita. O problema, repito, é unicamente seu temperamento explosivo, visto por muitos dos eleitores dos dois lados como "agressivo". A estes, é mais confiável um ladrão com fala mansa do que um honesto que solte um palavrão.
O comediante Gregório Duvivier, em seu programa semanal na HBO, falou sobre Ciro Gomes em uma edição do Greg News. A abordagem ao falar dele, no entanto, foi considerada por apoiadores do pedetista como errada, chegando aos ouvidos do próprio Ciro. Farpas foram trocadas pelos dois lados até que eles resolveram marcar uma data para o que seria um debate: 20 de maio.
Seria um debate, porque no dia, o que se viu foi um lulista declarado (e aí é problema do Gregório e de sua consciência) e o Ciro Gomes ainda putasso, cada um atacando o outro, se defendendo como podia e o que inicialmente foi vendido como um debate saudável para se chegar a um acordo virou uma discussão tóxica e constrangedora, com pontos negativos dos dois lados e sem nenhum vencedor. Ciro se desgasta mais com os indecisos, com a esquerda e com a direita graças a este encontro.
Fato é que, se Lula ganhar em outubro, os bolsonaristas tentarão provocar um tumulto nunca antes visto na história recente democrática, com direito a tiroteio, desobediência civil e, porque não dizer, golpe fechado com os militares?
Se Bolsonaro ganhar em outubro, os lulistas é que vão querer fazer isso. E se Ciro ou qualquer outro conseguir o feito de se eleger em cima desses dois nomes, por ser mais improvável, o desastre que viria é mais imprevisível.
Pegue isso com o detalhe da obrigatoriedade do voto: a abstenção, que foi de mais de 30% de eleitores que deixaram de ir votar em 2018, pode ser ainda maior, dado os limitados candidatos que se apresentam até o momento.
E, assim, a eleição caminha cada vez mais para a vulgar polarização entre o "vamos todos dar a bunda" contra o "vamos todos ter uma arma". Porque, sejamos sinceros, foi isso que esquerda e direita se tornaram no Brasil. A pior eleição da nossa história está chegando!